Registo único de dados em saúde em debate

Registo único de dados em saúde em debate

A criação de um registo único de dados em saúde, que permita a cada utente ter acesso ao seu historial clínico, é uma ambição de doentes, associações de doentes e profissionais de saúde. A centralização da informação de toda a população num único banco de dados tem vantagens inegáveis para quem circula entre as várias unidades de cuidados de saúde. As vantagens estendem-se à criação de um banco de dados valioso para gerar evidência em saúde e à poupança de custos e recursos, ao evitar a duplicação de exames complementares e tratamentos.

Falta agora avançar de forma «segura, ágil e abrangente», afirmou Jaime Melancia, membro da Direção da Plataforma Saúde em Diálogo, no encerramento do Fórum “Saber mais para apoiar melhor”, onde se debateram estratégias para concretizar este projeto. O evento, organizado em parceria com a Novartis, realizou-se a 26 de janeiro, no auditório da Associação Nacional das Farmácias, em Lisboa, com a participação de diversos stakeholders da área da saúde.

«Ouvimos falar de um registo único há duas ou três décadas e ainda não aconteceu, nem em Portugal, nem na Europa», desabafou Joaquim Cunha, o keynote speaker da sessão. O historial clínico de cada cidadão continua disperso pelas diferentes instituições de saúde, o que cria dificuldades aos profissionais e torna imprescindível o testemunho do doente. Não obstante, a digitalização e o uso inteligente dos dados em larga escala (big data), com foco no paciente, podem dar início a «uma nova saúde», nas palavras do diretor executivo da Health Cluster Portugal.

O Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) dificulta a criação deste registo único de dados em saúde, e esta é uma questão a tratar «a nível europeu». Entretanto, os próprios doentes podem autorizar a partilha de dados, o que permite a criação de plataformas específicas, como a que a associação EVITA vai disponibilizar em breve aos doentes oncológicos.

Muitos doentes partilham voluntariamente os seus dados para ter aconselhamento por parte do farmacêutico, confirmou Luís Lourenço, da Ordem dos Farmacêuticos, que considerou que a renovação da medicação crónica por parte das farmácias comunitárias é «muito difícil», sem partilha da informação. Defendeu a necessidade de «definir vários níveis de acesso à informação» e garantiu que as ordens profissionais estão preparadas para apoiar o processo. A presidente da Associação Nacional das Farmácias, presente na abertura dos trabalhos, confirmou também a disponibilidade das farmácias para «participar na concretização deste objetivo tecnológico».

Até que o registo único seja uma realidade, utentes e profissionais de saúde convivem com uma «manta de retalhos» de informação dispersa em «vários silos». «Como reduzir erros e agilizar a prestação de cuidados?», questionou-se Raquel Chantre, administradora hospitalar da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), durante a mesa-redonda, congratulando-se, no entanto, com alguns progressos já verificados.

Da parte dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), Luís Goes Pinheiro confirmou o trabalho desenvolvido ao nível dos meios complementares de diagnóstico nos cuidados primários de saúde, que envolveu a colaboração de mil prestadores de serviços. Defendeu que a estratégia não é começar de novo, mas antes aproveitar os dados existentes e, «em paralelo, trabalhar na definição de standards para, amanhã, os sistemas conseguirem trocar dados de forma segura».

O trabalho é complexo e terá de envolver os vários níveis de cuidados e o setor privado, responsável por 40% dos atos clínicos. A meta é um registo único de dados hegemónico, gratuito e de qualidade, que integre os registos paralelos entretanto criados. O registo deve centrar-se na pessoa e não na doença crónica de que padece, defendeu o presidente do Conselho de Administração dos SPMS, lembrando que houve já avanços significativos e que «Portugal não está aquém dos parceiros europeus em termos de saúde digital». Falta agora, como pediu Raquel Chantre, «mais agilidade a construir este futuro».

Conheça as principais conclusões da 1ª edição deste fórum.