
O antigo vice-presidente dos EUA e Prémio Nobel da Paz 2007 é sobejamente conhecido da opinião pública pela sua incansável causa para resolução da crise climática, tem publicado diferentes manifestos divulgados pelo mundo inteiro, caso de “Uma Verdade Inconveniente”. A sua mais recente investigação, portadora de dados fundamentais, intitula-se “O Futuro, seis forças que irão mudar o Mundo”, por Al Gore, Conjuntura Atual Editora, 2013. Como Al Gore escreve na introdução, um conjunto de forças de altíssimo significado convergem e interagem, nós podemos influenciar o curso dessas alterações globais, mas para isso temos de pensar de uma maneira nova em escolhas cruciais num contexto de economia mundial e de uma rede de comunicações eletrónicas que ligam os pensamentos e sentimentos de milhares de milhões de pessoas.
Numa tentativa de síntese, Al Gore estabelece o arco dos desafios prementes que temos pela frente: uma economia global que funciona cada vez mais como entidade holística totalmente integrada com uma ligação a fluxos de capital, mão-de-obra, mercados de consumo e governos nacionais; redes de comunicações eletrónicas ligando os pensamentos de pessoas e estas a volumes de dados em rápida expansão; o surgimento de um equilíbrio de poderes políticos, económicos e militares no mundo completamente diferente do equilíbrio que caraterizou a segunda metade do século XX, e por isso assistimos à deslocação de influência e iniciativa do Ocidente para o Oriente, dos países ricos para centros de poder rapidamente emergentes em todo o mundo; o surgimento de um crescimento rápido e insustentável em população, cidades, destruição de solo arável, etc.; o surgimento de um conjunto novo e revolucionário de potentes tecnologias biológicas, bioquímicas, genéticas e da ciências dos meterias que nos está a permitir restruturar a própria vida; o surgimento de uma relação completamente nova entre o poder agregado da civilização humana e os sistemas ecológicos da Terra. Não esconde Al Gore a sua preocupação dominante:
“A própria Terra, quando observada como um todo, é também um sistema aberto. Importa energia do Sol, que entra e atravessa os padrões complexos de transferência de energia que constituem o sistema da Terra, incluindo os oceanos, a atmosfera, os vários processos geoquímicos – e a própria vida. A energia depois volta para o universo em redor da Terra como energia térmica na forma de radiação infravermelha. A essência da emergente crise do aquecimento global passa por estarmos a importar quantidades enormes de energia da crosta terrestre e a exportar entropia (isto é, desordem progressiva) para sistemas ecológicos anteriormente estáveis, mas dinâmicos, dos quais depende a prosperidade contínua da civilização”.
É na abordagem “A reinvenção da vida e da morte” que Al Gore aborda matéria do maior interesse para profissionais e promotores de saúde e doentes de todos os quadrantes. Começa por referir que a digitalização das pessoas está a criar uma nova capacidade para alterar o ser no ser humano. Recorda que na atualidade há já cientistas que estão a manipular fígados sobressalentes, na verdade, as perspetivas de avanços em quase todas as formas de cuidados de saúde estão a gerar entusiasmo em muitas áreas da investigação médica.
A prática da medicina será previsivelmente transformada em breve, é o caso da “medicina de precisão”, que se baseia em modelos digitais e moleculares dos genes, proteínas, comunidades microbianas e outras fontes de informações medicamente pertinentes. Os cuidados preventivos de saúde serão muito mais eficazes. Também para Al Gore, os medicamentos, atualmente dirigidos a grandes grupos de indivíduos que manifestam sintomas semelhantes, serão em breve dirigidos para assinaturas genéticas e moleculares de pacientes individuais, revolução que já está a ocorrer no tratamento do cancro. Discreteando pela genómica e pela investigação nas ciências da vida, o autor não ilude o risco de que as desigualdades nos rendimentos irão gerar acessos desiguais à gama completa de inovações importantes na revolução em marcha das ciências da vida.
Todos os interessados no panorama atual da digitalização da vida, do efeito do genoma, da vida artificial, da clonagem de seres humanos, dos perigos dos antibióticos em animais, das horríveis teses sobre a eugenia, os novos métodos para estudar o cérebro, o estado atual do transumaníssimo, a criação de novos órgãos, os tremendos problemas épicos postos pela fertilidade, encontram neste assombroso relatório resposta elucidativa.
Interesse particular tem o ponto da situação da relação entre estilo de vida e longevidade. É do censo comum que a longevidade não é o mesmo que o envelhecimento, a longevidade é uma medição da duração da vida, enquanto envelhecimento é o processo através do qual a deterioração das células contribui com o tempo para condições que conduzem ao fim da vida.
Admite-se que os estudos genómicos completos de seres humanos possam resultar na descoberta de fatores genéticos que venham a ser usados para aumentar a longevidade de outros seres humanos. A frente contra as doenças é um grande campo de esperança. Reduziu o número de pessoas que morrem de SIDA. A principal razão para estes progressos é o maior acesso a medicamentos. Seja como for, os esforços para reduzir a taxa de infeção continuam centrados na prevenção, na distribuição de preservativos em zonas de alto risco e em tentativas de criar uma vacina.
Diminuiu significativamente a malária, parece eliminado o terrível flagelo da varíola bem como a peste bovina. As principais causas de morte no mundo de hoje são as doenças crónicas não contagiosas. E Al Gore elenca o estado atual das pesquisas sobre o cancro e mais adiante depois de fazer o ponto da situação sobre os alimentos geneticamente modificados explana sobre a mutação das doenças, refere as novas versões de doenças que estão a causar problemas a agricultores de todo o mundo e quais têm sido as repostas até agora encontradas.
No termo da viagem, Al Gore deixa várias mensagens sobre o sistema ecológico: quando o perturbamos, alteramos radicalmente o clima e o equilíbrio ambiental, não podemos ficar surpreendidos com consequências biológicas maiores do que aquelas que podemos remediar com tecnologias como engenharia genética. E referindo-se às bactérias, alerta-nos para o facto de que estamos ligados e dependemos dos 100 biliões de micróbios que vivem em cada um de nós do nascimento à morte, de igual modo estamos ligados e dependemos das formas de vida à nossa volta que habitam na própria terra.
O documento de Al Gore é de uma importância irrecusável; estas forças que irão mudar o mundo têm um peso determinante na nossa qualidade de vida. E há grandes esperanças para a nossa saúde que devemos conhecer.
Mário Beja Santos
Janeiro de 2014